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14 março, 2023

Felizmente tivemos a Idade Média

A perceção comum sobre a Idade Média (do século V ao XV) é de ter sido um período hediondo, caracterizado pela triste trilogia da fome, peste e guerra.
Castelo de Arnoia

Esta perspetiva nasceu no Renascimento (do século XV ao XVII), quando os seus intelectuais procuraram definir os dez séculos que separavam os dois períodos históricos ideais: o Clássico (que admiravam) e o Renascentista (que viviam). Depois, os pensadores iluministas, do século XVIII, acentuaram a ideia, que se traduziu na designada "Idade das Trevas". Ou seja, a partir do século XV, a época medieval começou a ser entendida do ponto de vista depreciativo. 

No Romantismo (século XIX), a valorização das origens nacionais medievais iniciou um entendimento mais favorável dessa época. Contudo, a ideia "das trevas" permaneceu. E ainda hoje continua a ser assim interpretada. Li num livro de história, editado em 2020, que "a vida na Idade Média era medonha e metia um bocado de impressão". 

De facto, não faltam razões para que se entenda a Idade Média dessa forma: além da famosa trilogia negativa, a própria sociedade, hierarquizada num sistema feudal, ajudou a dar mais ênfase à ideia: o povo vivia dependente dos senhores feudais e a Igreja, que tudo dominava, menosprezava o pensamento racional e impunha a sua visão única, centrada no temor a Deus.

Convém salientar que todas as épocas históricas têm momentos sombrios. Na Idade Moderna, tivemos o Absolutismo e continuou a triste trilogia. Na atualidade, continuamos a ter fome, guerra e peste (como a COVID-19), bem como ditaduras e religiões radicais. Apesar disto, não designamos as idades Moderna e Contemporânea como das trevas! Resumindo, a Idade Média não foi pior do que as outras. É preciso, assim, interpretar esse tempo com um outro olhar.

A bem da verdade, a par dos diversos males, o período medieval foi um tempo de paz e de progressos nas mais variadas áreas. Por exemplo, foi durante esse período que se começaram a delinear os países europeus como os conhecemos – como é o caso do nosso – e o latim deixou de ser uma língua comum para dar lugar aos diversos idiomas, como o português. As universidades e as instituições bancárias nasceram nessa era. Também surgiram movimentos literários e poéticos que ainda hoje são objeto de estudo e admiração, como o trovadorismo. Diversas invenções que fazem parte do nosso quotidiano e património, como a chaminé, a roca, o arado, o guindaste, o moinho de vento, o relógio mecânico e o uso das estrelas para orientação, foram contribuições que o período medieval nos legou. 

Da Idade Média herdamos, igualmente, a arte românica e a gótica. E é com base nas memórias do românico que, em 1998, germinou a Rota do Românico, projeto turístico-cultural, com 58 monumentos, nos vales do Sousa, Tâmega e Douro. Sem o românico, dificilmente teríamos este projeto agregador.

Igreja do mosteiro de Paço de Sousa

Por estas e outras razões, não se pode resumir esse período temporal a uma visão limitada, em que se destaca apenas o lado pior. Devemos, sim, entender a Idade Média como um tempo dinâmico, com bons e maus momentos, e que ajudou a preparar as épocas posteriores.

Para melhor compreensão do tema, sugiro a leitura do seguinte livro: A Idade Média: a verdadeira Idade das Luzes, de Seb Falk, publicado pela Bertrand Editora, em 2021.  


Joaquim Luís Costa – Vale do Sousa TV