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31 outubro, 2022

O primeiro desafio de Lula é o silêncio de Bolsonaro

O presidente eleito Luiz Inácio Lula da Silva começa já esta segunda-feira, 31 de outubro, a enfrentar os desafios que terá para governar pela terceira vez o Brasil, um país dividido, a começar pelo silêncio de Bolsonaro.

Os brasileiros ainda não ouviram uma mensagem do ainda presidente, que não se pronunciou publicamente após o anúncio dos resultados oficiais nem ligou para Lula, como é habitual nestas situações.

E a transição de poder pode mesmo representar um desafio, explica Paulo Calmon, professor de Ciência Política da Universidade de Brasília.

"Lula deve ter cuidado, antes de mais, com uma 'terceira volta', ou seja, com qualquer desafio que Bolsonaro e os seus aliados possam criar, como [Donald] Trump nos Estados Unidos, para deslegitimar a sua vitória e mobilizar o seu eleitorado", disse à AFP.

Lula teve mais dois milhões de votos que Bolsonaro, naquela que foi a vitória mais apertada numa segunda volta na história da democracia brasileira, após uma campanha polarizada e tensa.

Marco Antônio Teixeira, cientista político da Fundação Getúlio Vargas, afirmou que o presidente eleito terá que trabalhar para "ampliar a legitimidade do governo", com a presença no Executivo de "setores não petistas". E citou nomes, como o da terceira candidata mais votada na primeira volta, a senadora Simone Tebet, que depois apoiou Lula. Também terá de dialogar com governadores bolsonaristas. "Desta forma, [Lula] pode aumentar a sua legitimidade e ampliar o apoio, entrando em setores bolsonaristas. É preciso unir o país", acrescentou Teixeira.

Lula, que governou o Brasil de 2003 a 2010, chega ao poder com o apoio dos mais vulneráveis, um grupo que possui uma memória afetiva da bonança sob a sua administração. A sua campanha foi marcada por várias promessas para melhorar a economia, incluindo aumentar do salário mínimo e reforçar os programas sociais.

Adriano Laureno, da consultora Prospectiva, disse que o resultado de Bolsonaro, que foi o segundo colocado mais votado na história do país, significa que que Lula terá uma oposição "forte, organizada, inclusivé nas ruas".

Promessas

Durante a campanha, o líder do PT destacou as conquistas socioeconómicas dos seus dois primeiros mandatos, como a saída da pobreza de mais de 30 milhões de brasileiros graças a iniciativas sociais financiadas com o 'boom' das matérias-primas.

O terceiro mandato de Lula não contará com o mesmo cenário favorável: embora a economia dê sinais de melhoria, com crescimento, menos inflação e mais emprego, está longe da prosperidade dos anos 2000 e enfrenta um mundo em risco de recessão global.

Se não forem atendidas, as expectativas podem voltar como um bumerangue, alertam os analistas.

"Este é um governo que começa com muita dificuldade na parte económica. Vai assumir um cenário internacional complicado, numa possível recessão, com juros muito altos no Brasil e uma bomba fiscal com que tem de lidar", nota Laureno.

Governabilidade

No Congresso, onde os conservadores são maioria, com vários aliados de Bolsonaro eleitos a 2 de outubro, Lula pode enfrentar uma oposição legislativa mais complicada que nos seus mandatos anteriores.

O Partido Liberal de Bolsonaro terá a maior bancada na Câmara dos Deputados, com 99 representantes.

"A questão da governabilidade será um desafio. Lula vai precisar começar a formar uma equipa ministerial com outros partidos para garantir que assume a presidência numa posição legislativa mais forte", resume Laureno.

Marcelo Silva de Sousa /AFP